Da paróquia ao samba: padre do interior de SP deixa batina para se dedicar à música

Publicado em sábado, dezembro 3, 2022 · Comentar 


Padre do interior de SP deixa batina para se dedicar a música — Foto: Arquivo Pessoal

O samba não seria a primeira opção quando se pensa nos motivos para um padre largar a batina. As pessoas logo imaginam, por exemplo, falta de vocação ou um problema pessoal, principalmente com mulheres. Mas diferente disso, Douglas Oliveira teve uma decisão inusitada após 13 anos de dedicação à igreja católica. No Dia Nacional do Samba, o g1 conversou com um apaixonado pela música, que depois de anos servindo a comunidade de forma espiritual, mudou radicalmente de vida.

Douglas, de 38 anos, mora em Sorocaba (SP) e atualmente é gerente de uma cafeteria no bairro Protestantes, em Votorantim. Ele contou que aos 14 anos ganhou de um amigo um pandeiro e por conta disso começou a estudar música.

“Eu entrava no carro do meu pai, colocava samba, pagode e comecei a tocar. Até um dia e que um amigo me chamou para tocar no grupo dele. Então, a gente começou fazendo a apresentação em escola, em festa, ganhei um pouquinho de visibilidade com isso. Quando eu fui por ensino médio, no primeiro ano, fui chamado pra entrar no grupo”, relata.

Ele gostava tanto de música que acabou reprovando no colegial. Mas com 15 anos já era registrado e tocava em vários lugares.

“Na minha família nunca teve ninguém envolvido com isso, assim esse lado do samba, do pagode. Eu não tinha influência nenhuma em casa, foi por conta mesmo e por gostar do estilo. Eu descobri que conseguia cantar, descobri que eu era afinado, mas meu pai, e minha mãe sempre escutaram sertanejo”, comenta.

No mundo do samba, Douglas conta que ficou até os 20 anos. Nessa época, ele disse que teve uma situação difícil e resolveu parar de tocar. Ele frequentava a igreja católica com os pais e conheceu uma jovem de São Paulo que era de uma comunidade missionária, de um movimento eclesial e isso fez ele decidir entrar na comunidade.

Douglas quando foi ordenado padre em Sorocaba, no ano de 2016 — Foto: Arquivo Pessoal

Douglas quando foi ordenado padre em Sorocaba, no ano de 2016 — Foto: Arquivo Pessoal

“Entrei nessa comunidade em 2006 e fiquei até 2016. Dentro dessa comunidade, eu descobri que eu que gostava da vida sacerdotal, da comunicação, da catequese, da formação humana, da espiritualidade. Então, fiz filosofia, depois me formei em teologia e me ordenei como padre missionário.”

Depois que se ordenou, Douglas veio para a Diocese de Sorocaba e ficou padre no bairro Trujillo e depois na Catedral da cidade. Na comunidade missionário, ele conta que ficou afastado de tudo, chegou a trabalhar com música por um tempo dentro da igreja e tinha até músicas gravadas, mas não participava de nenhum evento.

Quando veio para a Diocese, como padre, Douglas conta que tinha uma vida menos rígida, com um pouco mais de liberdade, com os seus horários, e voltou a frequentar o samba.

“Pessoal me chamava de caríssimo, para não ficar me chamando de padre. Eu sempre cantava, fazia participações, tocava, às vezes, com eles, porque o pessoal sabia que era do samba. Fiquei amigo da galera e fiquei conhecido”, relembra.

Douglas com sua esposa, Jéssica e seus dois cachorros Banjo e Flor  — Foto: Arquivo Pessoal

Douglas com sua esposa, Jéssica e seus dois cachorros Banjo e Flor — Foto: Arquivo Pessoal

Com dois anos e meio do sacerdócio, ele resolveu sair. Com seis meses de discernimento sozinho, ele deixou o sacerdócio.

“Muitas vezes a primeira coisa que as pessoas pensam quando você sai da igreja é por causa de mulher. Na verdade, eu não saí por causa de mulher. Eu saí porque estava em xeque com a obra que eu morei. Depois, vim para a Diocese fazer uma experiência e vi que não era aquilo que eu queria. Eu já estava envolvido com o samba naquela época. Como padre eu já ia nos sambas, então foi tudo junto”, conta.

Para voltar a tocar, o incentivo todo foi da esposa, Jéssica, que talvez gosta muito de samba — Foto: Arquivo Pessoal

Para voltar a tocar, o incentivo todo foi da esposa, Jéssica, que talvez gosta muito de samba — Foto: Arquivo Pessoal

Em 2018, quando saiu, reencontrou uma amiga da comunidade, que hoje é sua esposa. Mas para voltar a tocar, o incentivo todo foi da esposa, Jéssica de Oliveira, que também gosta muito de samba.

“Eu voltei a tocar mesmo em 2020. Hoje faço parte dos projetos e sou freelance para os grupos. Ganhei o meu espaço aqui cantando, tocando e sigo o meu caminho. Tenho a intenção de montar um projetinho para mim, mais para frente. Sou muito feliz, hoje, de estar envolvido com tudo isso. Nada melhor que comemorar o dia do samba com o samba”, brinca.

Atualmente, Douglas não vive só da música. Além de trabalhar na cafeteria, como gerente, é celebrante de casamentos há mais de sete anos.

Atualmente, Douglas não vive só da música. Além de trabalhar na cafeteria como gerente, é celebrante de casamentos há mais de 7 anos — Foto: Arquivo Pessoal

Atualmente, Douglas não vive só da música. Além de trabalhar na cafeteria como gerente, é celebrante de casamentos há mais de 7 anos — Foto: Arquivo Pessoal

“Como trabalhei muito tempo com comunicação na igreja, fiz um programa de rádio também. Isso facilitou muito meu trabalho com a cerimônia. Trabalho com cafeteria, tenho uma agenda aberta com a cerimônia de casamento e pós cerimônia, eu tenho samba, né”, exclama.

“Meu sonho, mesmo, é viver só da cerimônia e do samba, mas eu ainda não consigo. Quem sabe um dia”, finaliza.

Da Redação 
Com G1 Sorocaba/Jundiaí 

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