Lucy Alves, que em ‘Travessia’ será trocada pelo noivo, revela: ‘Já fui corna e já traí. Acho que tudo depende dos acordos’

Publicado em segunda-feira, outubro 10, 2022 · Comentar 


Sai a onça, entra a gata. Com a despedida de Juma Marruá (Alanis Guillen) e do sucesso “Pantanal”, o horário nobre da TV Globo caminha em direção a outra heroína com ares felinos. Quem assim define é Lucy Alves, protagonista de “Travessia”, novela escrita por Gloria Perez e dirigida por Mauro Mendonça Filho que estreia nesta segunda-feira (dia 10) na faixa das 21h. “Eu costumo associar as personagens a animais, e vejo Brisa como um gato, sabe? É um bicho desconfiado e muito rápido. Nada bobo, tem a sagacidade da rua. Ela é assim, uma mulher íntegra, que acredita nas pessoas e quer dar chance a elas.

Mas, pisou no calo, Brisa resolve a parada”, adianta a atriz e cantora revelada ao Brasil na edição de 2013 do “The voice” e que este ano voltou a (en)cantar num reality musical sob a fantasia da leoa do “The masked singer”. Em conversa exclusiva com a Canal Extra, a paraibana de 36 anos falou sobre sua representatividade como “mulher, preta e nordestina”, enaltecendo a cultura do Maranhão na nova novela; a responsabilidade de manter em alta a audiência no horário; sua relação com a internet — a vida da personagem sofre uma reviravolta ao ser vítima de crime virtual, o deepfake —; bissexualidade, beleza e carreira musical, entre outros assuntos.

Este não será o seu primeiro papel de destaque no horário nobre. Você foi aclamada como Luzia, em “Velho Chico” (2016), dividiu os louros de Lourdes com Regina Casé em “Amor de mãe” (2019)… O que Brisa representa?

Estou num momento de maturidade na carreira. Tenho feito mulheres que vêm do Nordeste, minha raiz, minha identidade. E todas são livres, não abrem mão do que gostam, do que as faz felizes. Nos dias de hoje, isso é representatividade. Brisa é uma heroína que vai estar no ar por mais tempo, enfrentando percalços e aventuras. Ela é do Maranhão, tem essa questão da cultura local, mas costura toda a trama. E é criada por Gloria Perez, uma autora que admiro demais! Ela sabe escrever como ninguém, aborda questões atuais e diferentes. Também é um desafio pra mim estar em meio a um elenco de estrelas, afiado. Não vou dizer que seja fácil, mas está sendo muito prazeroso. O clima no set é muito bom, e está só começando.

Este trabalho enaltece o Nordeste, focando na cultura do Maranhão. Você, que é paraibana, já conhecia os costumes de lá?

Muito pouco. Eu já tinha estado em São Luís e outras cidades maranhenses para fazer shows. Mas chegava e ia embora. Esse quase um mês que passamos lá foi uma oportunidade única. Tanto para o entrosamento do elenco quanto para descobrir o quão intenso e maravilhoso é o Maranhão. Um lugar místico, de muitos personagens interessantes e crenças. A música tem vários sotaques com as manifestações culturais, desde o Bumba Meu Boi até o Tambor de Crioula, passando pelas Caixeiras do Divino. A história vai passando pela oralidade… É encantador. Assim como a Bahia, chama muita atenção pela religiosidade e pelas belezas naturais. Os Lençóis Maranhenses são um lugar surreal! Estive lá de dia e à noite, observei as estrelas… Aprendi a dançar o Boi, que sempre achei tão difícil quando via a minha amiga Thaynara OG fazer. Foi massa poder conversar, provar as comidas, sentir como o maranhense enxerga as coisas. Trouxemos isso tudo pro set de gravações no Rio.

“Só se for por amor”, série recém-lançada pela Netflix, se passa em Goiás. Então, ambas as produções das quais você é protagonista, atualmente, saem do eixo Rio-São Paulo…

Pois é, essa também tem muito a ver comigo. Mostra o universo sertanejo e a diversidade musical do país. A gente fez uma viagem pelo pop de Pabllo Vittar e Anitta. Maria Gadú compôs músicas e fez arranjos para a série. É massa ver no streaming uma banda com sanfoneira. Estou sempre falando do meu Brasil, graças a Deus. Esse país está merecendo um carinho, e pra mim é uma honra retratar meu povo e minha cultura.

Você pôde conservar o seu sotaque?

Pra Deusa, de “Só se for por amor”, pude manter o meu jeito de falar, porque ela também é paraibana. Pra Brisa, tive que acrescentar umas nuances, porque o sotaque do Maranhão tem um chiadinho que na Paraíba não tem, a gente fala mais seco.

Qual foi a maior travessia que você já enfrentou na vida?

Sem dúvida, trocar a Paraíba pelo Rio de Janeiro. Vivi boa parte da minha vida em João Pessoa, fui muito feliz e aprendi muito lá. Pude estudar, conviver com família e amigos, e esse alicerce foi importantíssimo. Mas vir pra cá sozinha virou uma página da minha história. Já vai fazer seis anos que estou no Rio, e construí tudo do zero, sem conhecer pessoas do mercado musical nem da dramaturgia. Eu me atirei e não me arrependo. Cresci e sigo evoluindo profissionalmente. Essa mudança me abriu muito a cabeça, é outra parada. A gente tem sempre que abdicar de coisas quando escolhe, é claro. Eu deixei família e amigos longe.

Você participou de dois realities musicais, o “The voice Brasil” e o “The masked singer”, ficando em segundo e terceiro lugares, respectivamente. Hoje, brilha como protagonista. Não é sobre ganhar sempre, né?

Brinco que sou cria dos realities. A Globo inventa e me convida, eu vou. Quando a gente encara como uma competição saudável, uma plataforma para projetar, é muito legal. O “The voice” foi assim, eu participei despretensiosamente. Achava que ia ficar um dia só no ar com a minha sanfona e já ia valer, porque tanta gente ia me ver… De repente, eu estava na final. E no “The masked singer”, nem pensei em competição, só queria me divertir. Achava engraçada a coisa das fantasias, de representar um personagem aleatório, uma criatura. No meu caso, a leoa. Quando nos conectamos com a nossa criança interior, a criatividade vem à tona. Eu só queria brincar.

Mas você é competitiva? Ficou chateada ao perder?

Eu fico competindo comigo mesma. Não vou mentir, não gosto de perder. Mas acho que tenho uma relação saudável com isso, não me aflige. Eu dou o meu sangue até o fim.

Aceitaria participar de um outro estilo de reality, o “Big Brother Brasil”?

Aí também é demais (risos)… Talvez a minha saúde mental não suporte. Seria muito tempo confinada, eu nem sei o que passaria pela minha cabeça. Neste momento, não me chamem, não tenho vontade. Mas eu nunca digo nunca, amanhã posso acordar e querer estar lá.

Como tem encarado a responsabilidade de manter a audiência em alta após o sucesso de “Pantanal”?
É bom porque “Pantanal” já entrega pra gente uma audiência aquecida. A missão é segurar assim. Mas “Travessia” é tão boa, tão bem conduzida, que eu só tenho que exercer o meu papel e convencer. Com novela da Gloria, é muito difícil dar ruim. A história da minha personagem é muito boa, real, atual… Estou torcendo para que dê certo e eu consiga tocar as pessoas. É sobre isso, aliás. A missão maior é fazer quem está do outro lado da tela se identificar e/ou se emocionar.

Acredita que Brisa vá conseguir ocupar o lugar deixado por Juma no coração do público? A leoa vai entrar no lugar da onça…

(Risos) Juma vai deixar muita saudade, mas Brisa vai trazer novos ventos. Curioso é que muita gente falava que eu ia interpretar Juma. Temos em comum essa coisa felina, guerreira.

Você vem sendo celebrada como mais uma protagonista negra de novelas, à semelhança de Taís Araujo. Essa representatividade é significativa para você?

Com certeza. Eu me enxergo como uma mulher negra de traços indígenas. Venho entendendo o meu lugar de fala. Esse espaço, esse protagonismo, tem me proporcionado debates. O que eu puder fazer pra levantar essa bandeira de mulher preta nordestina, farei. É uma iniciativa importante nesse horário, não caminha para trás. Tenho me preparado para cada vez mais honrar essa janela que me foi aberta. No momento em que jogam luz sobre a gente, é importante que tenhamos o que falar.

Mulheres nordestinas, geralmente, são vistas como fortes, intensas. É curioso essa se chamar Brisa, nome que traz a ideia de leveza e fragilidade. Existe essa faceta nela?

É verdade… Essa pode ser brisa, vento, ventania… Brisa é uma força da natureza. Ela é uma heroína muito humana, que tem suas fragilidades e medos. Não está sempre com o dedo em riste, mas é combativa. Ela enfrenta tudo, é capaz de passar por cima de pau, pedra, o que for. Só que é uma mulher suave também. Eu costumo associar as personagens a animais, e vejo Brisa como um gato, sabe? É um bicho desconfiado e muito rápido. Nada bobo, tem a sagacidade da rua. Ela é assim, uma mulher íntegra, que acredita nas pessoas e quer dar chance a elas. Mas, pisou no calo, resolve a parada.

Você se considera mais brisa ou furacão?

As duas coisas. Eu sou pisciana, sonhadora, tranquila, fácil de lidar. Procuro não esquentar, mas também gosto que as coisas sejam feitas do meu jeito. No geral, eu sou uma brisa boa. Só faço tempestade quando as coisas saem do controle. No final, a gente percebe que se aperreou à toa.

A personagem traz a temática dos crimes virtuais. Você já se viu vítima de mentiras absurdas na internet?

Absurdas, não. Mas já deturparam declarações minhas. O caso da Brisa é bizarro, a ponto de mudar a vida dela. Outras pessoas na mesma situação morreram por consequência do fake. É um assunto sério que vamos retratar na novela e que hoje em dia acontece frequentemente, não só com famosos. Aplicativos permitem mudar o rosto, movimentos de boca. Então é muito fácil espalhar mentiras que podem causar tragédias. Metaverso, deepfake, hacker, são assuntos que vão ser abordados. É informativo e urgente.

Como você se protege virtualmente? É cuidadosa com o que posta, pensa mil vezes antes?
Cada vez mais eu venho pensando nisso: caiu na rede, é tão difícil de tirar… Se espalha numa velocidade avassaladora, você não tem controle. A minha luta é não deixar de ser eu, não me privar. Curtir e saber usar, porque é divertido. Tomo conta das minhas redes junto a uma equipe. Tudo passa por mim, estou sempre lendo os comentários. A internet é um lugar livre para opiniões e, por isso, pode ser muito cruel. Quando você é exposto, as pessoas comentam. Ninguém é obrigado a gostar de mim. Desde o “The voice”, eu lia gente amando a minha performance e gente questionando por que eu estava lá. Fui passando a filtrar, separar a crítica construtiva do ódio gratuito. Hater é nocivo à saúde mental e vai engessando a gente. Com medo, não postamos porque pode dar merda. Aí viramos bonecos artificiais. Mas o que atrai é a espontaneidade… É um universo cada vez mais complexo. Assustador e encantador.

Da Redação 
Com ClickPB 

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