Pessoas incapacitadas devido à esclerose múltipla grave têm uma nova esperança de cura. De acordo com um estudo publicado recentemente no periódico científico The Lancet, 23 pacientes voltaram a andar, trabalhar e até mesmo esquiar após serem submetidos a um tratamento inovador com células-tronco.
A terapia, desenvolvida por pesquisadores canadenses, primeiro destrói completamente o sistema imunológico com a ajuda de uma quimioterapia, para então reconstruí-lo com a transfusão de células-tronco da medula óssea. Dos 24 pacientes submetidos ao tratamento, 70% tiveram a progressão da doença interrompida ou revertida e 40% apresentaram a reversão de sintomas graves como a perda da visão, fraqueza muscular e perda de equilíbrio.
A esclerose múltipla é uma doença neurológica incurável e com efeitos devastadores que atinge cerca de 2,3 milhões de pessoas no mundo, dentre elas 35 000 brasileiros. De causa desconhecida, a doença se manifesta de uma hora para outra, quando o sistema imunológico ataca a mielina, substância que protege as fibras nervosas do cérebro, da medula espinal e do nervo óptico. A cada surto, as lesões formam áreas de cicatrização, ou escleroses, que causam danos irreversíveis e podem deixar sequelas como cegueira, paralisia, lapso de memória e dificuldades na fala e na deglutição. Os medicamentos disponíveis atualmente para conter a moléstia não são 100% eficazes e podem proporcionar fortes efeitos adversos ao paciente.
O estudo canadense é o primeiro a trazer esperança de cura para portadores de esclerose múltipla grave, que não respondem aos tratamentos disponíveis atualmente, e é o primeiro que conseguiu parar e reverter a doença em longo prazo sem a necessidade de outros medicamentos. Todos os pacientes do estudo tinham esclerose agressiva, recidiva e foram acompanhados por até 13 anos após o tratamento. De acordo com o jornal britânico The Telegraph, seus resultados foram considerados ’emocionantes’ e ‘sem precedentes’ por especialistas.
“Nosso estudo é o primeiro a mostrar a supressão completa, em longo prazo de toda a atividade inflamatória em pessoas com esclerose múltipla. Uma variação deste procedimento tem sido utilizada para tratar a leucemia há décadas, mas a sua utilização para doenças autoimunes é relativamente nova. No entanto, é importante notar que esta terapia pode ter riscos e efeitos colaterais graves e só seria apropriada para uma pequena porção de pessoas que têm esclerose múltipla severa”, disse Harold Atkins, professor na Universidade de Ottawa, no Canadá e um dos autores da pesquisa, ao Telegraph.
Durante o estudo, um participante morreu de insuficiência hepática e outro precisou de tratamento intensivo devido a complicações hepáticas. Apesar dos riscos, para cerca de 5% dos portadores da forma grave e recidiva da doença, essa nova terapia talvez seja a única esperança.
Como funciona — Inicialmente, o paciente é submetido a um curto ciclo de quimioterapia que estimula a produção de células-tronco hematopoiéticas – que regeneram o sistema imunológico – no sangue. Em seguida, estas células estaminais são recolhidas, purificadas de qualquer sinal da doença e congeladas para depois serem reinseridas no corpo da pessoa por meio de uma transfusão. Mas, antes disso, o paciente precisa ser submetido a 10 dias de quimioterapia. Essa fase do tratamento, considerada o “inferno” pelos pacientes, tem o objetivo de matar o sistema imunológico doente. Então, as células estaminais congelados são descongeladas e transplantadas para o corpo da pessoa, de modo que elas possam originar um novo sistema imunológico livre da memória anterior de atacar o sistema nervoso central.
O problema é que, ao matar o sistema imunológico do paciente, o corpo não só fica livre da doença, mas também está mais vulnerável a infecções e precisa reaprender a se defender de bactérias e vírus.
Jennifer Molson, uma das participantes do estudo, foi diagnosticada com esclerose múltipla em 1996, aos 21 anos. Apenas cinco anos depois, em 2001, ela vivia em um hospital sob 24h de cuidados, pois não conseguia fazer nada sozinha. “Eu não tinha sensação do peito para baixo. Eu poderia tocar alguma coisa fervendo no fogão e me queimar. Eu podia tocar algum tecido sem saber se é uma lixa”, contou ao site de notícias americano Vox. Jennifer foi submetida ao novo tratamento em 2002 e dois anos depois ela já conseguiu entrar na igreja e dançar em seu casamento.
Da Redação
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