Após a abertura da sessão virtual da a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 442) pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, o ministro Luis Roberto Barroso registrou seu voto favorável à descriminalização do aborto até 12 semanas nesta sexta-feira (17).
“Ninguém é a favor do aborto em si. O papel do Estado e da sociedade é o de evitar que ele aconteça, dando educação sexual, distribuindo contraceptivos e amparando a mulher que deseje ter o filho e esteja em circunstâncias adversas. Deixo isso bem claro para quem queira, em boa-fé, entender do que se trata verdadeiramente”, disse o ministro no início de seu voto. “A discussão real não está em ser contra ou a favor do aborto. É definir se a mulher que passa por esse infortúnio deve ser presa”, completa.
Barroso havia pedido ao presidente da Corte a convocação de uma sessão extraordinária no plenário virtual para dar continuidade ao julgamento e poder votar sobre o tema. Até agora, além do voto do ministro, apenas a ex-ministra e relatora Rosa Weber expôs seu posicionamento, também favorável à ação.
Durante o voto, o ministro ressaltou que “praticamente nenhum país democrático e desenvolvido do mundo adota como política pública a criminalização da interrupção da gestação nas primeiras semanas”. “Isso inclui 39 países europeus e outros pelo globo, como Alemanha, Austrália, Canadá, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal e Reino Unido. Nos Estados Unidos, a Suprema Corte decidiu que cabe a cada Estado-membro da Federação decidir, sendo que a maioria deles permite”, pontuou.
“As mulheres são seres livres e iguais, dotadas de autonomia, com autodeterminação para fazerem suas escolhas existenciais. Em suma: têm o direito fundamental à sua liberdade sexual e reprodutiva. Direitos fundamentais não podem depender da vontade das maiorias políticas. Ninguém duvide: se os homens engravidassem, aborto já não seria tratado como crime há muito tempo”, argumentou o ministro.
‘É possível ser contra o aborto e contra a criminalização’
Ainda em seu voto, Barroso afirmou ter “profundo respeito pelo sentimento religioso das pessoas” e que, por isso, é “plenamente legítimo ter posição contrária ao aborto, não o praticar”.
“Mas será que a regra de ouro, subjacente a ambas as tradições – tratar o próximo como desejaria ser tratado –, é mais bem cumprida atirando ao cárcere a mulher que passe por esse drama? Pessoalmente, entendo que não. Portanto, sem renunciar a qualquer convicção, é perfeitamente possível ser simultaneamente contra o aborto e contra a criminalização”
Em que pé está a discussão no STF
Com o voto de Barroso, a Corte já contabiliza dois votos a favor da descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. Outros nove ministros ainda devem se pronunciar. No entanto, dois ministros estarão impedidos de votar no caso: o relator Flávio Dino, que substituiu Rosa Weber, e o futuro ministro que preencher a vaga deixada por Barroso.
O STF também formou maioria para revogar a decisão do ministro Luís Roberto Barroso, que autorizava nesta sexta-feira (17) que enfermeiros auxiliassem procedimentos de aborto nos casos previstos em lei. A decisão ocorreu logo após Barroso apresentar seu último voto antes de antecipar a aposentadoria.
A votação trata da ADPF 442 foi protocolada em 2017 pelo PSOL e pelo Instituto Anis, que questiona se mulheres e responsáveis por abortos devem ser punidos. A ação pede que o aborto seja permitido até a 12ª semana, modelo adotado na Alemanha. No documento, as autoras destacam o alto número de abortos no Brasil, apontando que os riscos atingem principalmente mulheres e adolescentes vulneráveis, como negras e pobres, como também mostrou a Fórum. O tema chegou ao STF por meio de uma ação do PSOL e em 2018, a ministra Rosa Weber realizou a primeira audiência pública sobre o assunto, que antes de se aposentar também declarou seu voto favorável à ação. A ação ficou fora da pauta do STF desde então.
O movimento de voto foi acertado entre os dois ministros. Rosa buscava registrar seu voto antes da aposentadoria, enquanto Barroso se preocupava com a repercussão no Congresso e na sociedade, considerando que não era o momento adequado para discutir o tema.
Hoje, o aborto é permitido no Brasil apenas se houver risco de vida para a gestante, em casos de estupro ou se o feto for anencéfalo. A ação aponta que as bases jurídicas da criminalização de 1940 não têm validade. Conforme a petição inicial, elas “violam os preceitos fundamentais da dignidade, da cidadania, da não discriminação, da inviolabilidade da vida, da liberdade, da igualdade, da proibição de tortura”, entre outros.
Redação/Forum
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