
Desde que a depressão se apossou da minha alma como uma tempestade implacável, tenho sido um viajante solitário pelas ruas do meu amado Marí. Nas sombras do centro da cidade, encontrei refúgio próximo à Rádio Comunitária, onde também repousa a Casa de Cultura e o edifício que abrigará um futuro Centro de Documentação e História do nosso município. E aqui, nas praças coloridas e muros desgastados, encontrei meu improvável lar, meu santuário.
Minha cama é um modesto tablado que já foi palco de performances culturais vibrantes. Mas agora, é onde descanso minhas angústias e onde os sonhos inquietos me visitam à noite. Um tablado improvisado em uma praça que, para muitos, é apenas um espaço público comum. Mas para mim, é um santuário de cores e expressão.
Nos olhos da sociedade, sou invisível. Meu sofrimento é silencioso, mas minha arte é ruidosa. Pinto muros e paredes com desenhos que emanam amor, sabedoria e luta. Escrevo frases de efeito que ecoam como um clamor por compreensão e solidariedade. Sou um artista, mas alguns me veem como um vândalo. O preconceito social, muitas vezes, é cego à dor que carrego e à beleza que tento compartilhar.
Lembro-me do icônico Profeta Gentileza, cujas pinturas nos muros do Rio de Janeiro ecoam em meu coração. Ele também foi rotulado como louco, mas sua loucura era uma fonte de sabedoria. Sua arte nas ruas não era vandalismo; era uma mensagem de amor e fraternidade. Ele acreditava que todos nós éramos irmãos, e suas palavras e desenhos eram um apelo para que cuidássemos uns dos outros.
Assim como o Profeta Gentileza, eu também sou movido por uma força interior que me impulsiona a pintar os muros e as almas da minha cidade. A arte e a loucura têm uma relação complexa. Muitas vezes, é na turbulência da mente que a criatividade mais profunda floresce. A arte é uma válvula de escape, uma maneira de traduzir o indizível em cores e formas.
A sociedade pode confundir minha arte com vandalismo, mas não me importo. Continuarei a pintar os muros da cidade que amo, não como um vândalo, mas como um mensageiro de esperança e cura. Talvez, um dia, as pessoas compreendam que a arte e a loucura são intrinsecamente ligadas, que a criatividade muitas vezes emerge das profundezas da dor. Até lá, vou continuar a transformar a cidade de Marí em um caleidoscópio de emoções e mensagens, na esperança de que, um dia, nossos muros falem de amor, compreensão e aceitação.
* Secretário de Cultura e Esportes de Marí
Membro da Academia Sapeense de Letras, Arte e Cultura


Redação/ExpressoPB





