O ex-presidente Lula faz nesta tarde um pronunciamento à imprensa nacional e internacional sobre a denúncia do Ministério Público Federal apresentada ontem contra ele.
Em sua fala, Lula alfinetou FHC, que, segundo ele, apostava no seu fracasso. “Ele não sabia que eu tinha em mente o fracasso do Lech Walesa. Eu dizia: eu não posso fracassar e tinha como uma profissão de fé não errar”, disse.
“Eu fui humilde: se cada brasileiro pudesse realizar três refeições por dia, eu já tinha realizado a obra da minha vida”, acrescentou.
Lula destacou que o ex-presidente Juscelino Kubitschek deve ter sido vítima de mais inquéritos do que ele. Getúlio em quatro anos de democracia se matou, afirmou.
“Tentaram fazer comigo o que fizeram com a Dilma em 2005. O objetivo era tirar o Lula já em 2005”, declarou.
Para Lula, o seu “fracasso não teria despertado tanto ódio contra o PT. O que despertou a ira foi o sucesso desse governo”. “Se quiserem me tirar, vão ter que disputar comigo na rua”, ressaltou.
Sobre o impeachment de Dilma Rousseff, ele lembrou que foi articulado “por um homem que acaba de ser cassado”. “Conseguiram dar um golpe pacífico”, disse, ponderando, no entanto, a violência da Polícia Militar contra manifestantes.
“Se eles tratassem ladrão como tratam a molecada honesta que vai para rua, talvez não tivesse tanto ladrão. É uma vergonha jornalista ir para a rua de capacete”, criticou.
O ex-presidente falou então sobre as instituições no País, e como elas se fortaleceram durante seu governo. Mas afirmou que “a lógica de hoje é a manchete, não os autos de um processo”. “Quem é que nós vamos criminalizar?”, perguntou, em crítica à Lava Jato. “Só ganha de mim aqui no Brasil Jesus Cristo”, acrescentou, sobre acusações contra ele.
Sobre a coletiva do MP, afirmou: “Eles construíram uma mentira, uma inverdade, como se fosse um enredo de uma novela. E tá chegando o fim do prazo, afinal de contas já cassaram o Cunha, já elegeram o Temer, pela via indireta, pelo golpe, já cassaram a Dilma, agora precisa concluir a novela. Acabar com a vida política do Lula. Porque não existe outra explicação para o espetáculo de pirotecnia”.
“Eu respeitaria mais a família deles do que eles respeitaram a minha. Vocês pensam que foi fácil suportar a invasão da minha casa? Invadiram as casas dos meus filhos”, citou Lula. “Até os meus discursos eles levaram do instituto, certamente pra plagiar”.
Ele ironizou o senador Aécio Neves (PSDB-MG) ao dizer que “tinham provas de um helicóptero com 400kg de cocaína, mas não tinham convicção, então liberaram”.
“Não sei porque fazer uma coletiva para apresentar a prova de um crime, e não tem crime, tem convicção. Ninguém respeita a lei desse país mais do que eu”, assegurou. “Sou daqueles que acreditam que só com instituições fortes há democracia”, acrescentou.
Lula acredita que “Janot deve estar pensativo hoje”, que “os ministros do STF devem estar pensativos. O que aconteceu? À custa do que esse espetáculo? Por que vender um produto que não tem como entregar? Não adianta matar e esquartejar, como fizeram com Tiradentes”. “Vocês vão ter problema com o golpe que vocês deram”, alertou.
“Vocês não podem permitir que meia dúzia de pessoas estraguem a reputação de uma instituição como o Ministério Público. Eu conheço gente que vive por cinco minutos de fama na televisão, essa pessoa vive pouca. A única coisa que eu peço, por favor, é que respeitem a minha família”, pediu.
“Eu não tenho tempo de parar, o país que eu sonho ainda está muito distante de ser construído. Nada, só Deus, pode me fazer parar de lutar”, afirmou. “Esta meninada que tá vindo pra rua lutar é um Lula multiplicado por 50 milhões de Lulas pelo país!”.
O ex-presidente fez uma provocação aos procuradores, especialmente a Dallagnol, ao dizer que “tem gente que passou em concurso público que é analfabeto político, não sabe o que é governo de coalizão”. “Quando eu transgredir a lei, me punam para servir de exemplo. Mas quando eu não transgredir, procurem outro para criar problema”, pediu Lula.
Ele disse ainda que “cada petista tem que começar a andar de camisa vermelha”. “Estou com 70 anos e com vontade de viver mais 20, a história mal começou”, discursou.
O primeiro a falar hoje foi o presidente do PT, Rui Falcão. “O objetivo é retirar da cena política o principal líder do povo brasileiro”, disse ele, que denunciou um regime de exceção no Brasil.
Em nota aprovada hoje, a Executiva do PT repudiou o “grotesco espetáculo midiático” do MP, apontou “parcialidade” do procurador Deltan Dallagnol, responsável por apresentar a acusação, e lembrou que ele fez denúncias “confessadamente sem provas”.
Abaixo, a nota divulgada ontem pela defesa do ex-presidente Lula:
Lula e D. Marisa Letícia repudiam denúncia da Lava Jato
Denúncia do MPF é truque de ilusionismo; coletiva é um espetáculo deplorável
Luiz Inácio Lula da Silva e sua esposa Marisa Letícia Lula da Silva repudiam publica e veementemente a denúncia ofertada na data de hoje (14/09/2016) pelo Ministério Público Federal (MPF), baseada em peça jurídica de inconsistência cristalina.
A denúncia em si perdeu-se em meio ao deplorável espetáculo de verborragia da manifestação da Força Tarefa da Lava Jato. O MPF elegeu Lula como “maestro de uma organização criminosa”, mas “esqueceu” do principal: a apresentação de provas dos crimes imputados. “Quem tinha poder?” Resposta: Lula. Logo, era o “comandante máximo” da “propinocracia” brasileira. Um novo país nasceu hoje sob a batuta de Deltan Dallagnol e, neste país, ser amigo e ter aliados políticos é crime.
A farsa lulocentrica criada ataca o Estado Democrático de Direito e a inteligência dos cidadãos brasileiros. Não foi apresentado um único ato praticado por Lula, muito menos uma prova. Desde o início da Operação Lava Jato houve uma devassa na vida do ex-Presidente. Nada encontraram. Foi necessário, então, apelar para um discurso farsesco. Construíram uma tese baseada em responsabilidade objetiva, incompatível com o direito penal. O crime do Lula para a Lava Jato é ter sido presidente da República.
O grosso do discurso de Dallagnol não tratou do objeto da real denúncia protocolada nesta data – focada fundamentalmente da suposta propriedade do imóvel 164-A do edifício Solaris, no Guarujá (SP). Sua conduta política é incompatível com o cargo de Procurador da República e com a utilização de recursos públicos do Ministério Público Federal para divulgar suas teses.
Para sustentar o impossível – a propriedade do apto 164-A, Edifício Solaris, no Guarujá – a Força Tarefa da Lava Jato valeu-se de truque de ilusionismo, promovendo um reprovável espetáculo judicial-midiático. O fato real inquestionável é que Lula e D. Marisa não são proprietários do referido imóvel, que pertence à OAS.
Se não são proprietários, Lula e sua esposa não são também beneficiários de qualquer reforma ali feita. Não há artifício que possa mudar essa realidade. Na qualidade de seus advogados, afirmamos que nossos clientes não cometeram, portanto, crimes de corrupção passiva (CP, art. 317, caput), falsidade ideológica (CP, art. 299) ou lavagem de capitais (Lei nº 9.613/98, art. 1º).
A denúncia não se sustenta, diante do exposto abaixo:
1- Violação às garantias da dignidade da pessoa humana, da presunção da inocência e, ainda, das regras de Comunicação Social do CNMP.
A coletiva de imprensa hoje realizada pelo MPF valeu-se de recursos públicos para aluguel de espaço e equipamentos exclusivamente para expor a imagem e a reputação de Lula e D. Marisa, em situação incompatível com a dignidade da pessoa humana e da presunção de inocência. O evento apresentou denúncia como uma condenação antecipada aos envolvidos, violando o art. 15, da Recomendação n.º 39, de agosto de 2016, do Conselho Nacional do Ministério Público, que estabelece a Política de Comunicação Social do Ministério Público.
2- Não há nada que possa justificar as acusações.
2.1 – Corrupção passiva –
O ex-Presidente Lula e sua esposa foram denunciados pelo crime de corrupção passiva (CP, art. 317, caput), no entanto:
2.2.1 O imóvel que teria recebido as melhorias, no entanto, é de propriedade da OAS como não deixa qualquer dúvida o registro no Cartório de Registro de Imóveis (Matricula 104801, do Cartório de Registro de Imóveis do Guarujá), que é um ato dotado de fé pública. Diz a lei, nesse sentido: “Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis”. A denúncia não contém um único elemento que possa superar essa realidade jurídica, revelando-se, portanto, peça de ficção.
2.2.2. Confirma ser a denúncia um truque de ilusionismo o fato de o documento partir da premissa de que houve a “entrega” do imóvel a Lula sem nenhum elemento que possa justificar tal afirmação.
2.2.3. Lula esteve uma única vez no imóvel acompanhado de D. Marisa — para conhecê-lo e verificarem se tinham interesse na compra. O ex-Presidente e os seus familiares jamais usaram o imóvel e muito menos exerceram qualquer outro atributo da propriedade, tal como disposto no art. 1.228, do Código Civil (uso, gozo e disposição).
2.2.4. D. Marisa adquiriu em 2005 uma cota-parte da Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop) que, se fosse quitada, daria direito a um imóvel no Edifício Mar Cantábrico (nome antigo do hoje Edifício Solaris). Ela fez pagamentos até 2009, quando o empreendimento foi transferido à OAS por uma decisão dos cooperados, acompanhada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. Diante disso, D. Marisa passou a ter a opção de usar os valores investidos como parte do pagamento de uma unidade no Edifício Solaris – que seria finalizado pela OAS — ou receber o valor do investimento de volta, em condições pré-estabelecidas. Após visitar o Edifício Solaris e verificar que não tinha interesse na aquisição da unidade 164-A que lhe foi ofertada, ela optou, em 26.11.2015, por pedir a restituição dos valores investidos. Atualmente, o valor está sendo cobrado por D. Marisa da Bancoop e da OAS por meio de ação judicial (Autos nº 1076258-69.2016.8.26.0100, em trâmite perante a 34ª. Vara Cível da Comarca de São Paulo), em fase de citação das rés.
2.2.5. Dessa forma, a primeira premissa do MPF para atribuir a Lula e sua esposa a prática do crime de corrupção passiva — a propriedade do apartamento 164-A — é inequivocamente falsa, pois tal imóvel não é e jamais foi de Lula ou de seus familiares.
2.2.6. O MPF não conseguiu apresentar qualquer conduta irregular praticada por Lula em relação ao armazenamento do acervo presidencial. Lula foi denunciado por ser o proprietário do acervo. A denúncia se baseia, portanto, em uma responsabilidade objetiva incompatível com o direito penal
2.3 – Lavagem de Capitais
Lula foi denunciado pelo crime de lavagem de capitais (Lei nº 9.613/98, art. 1º) sob o argumento de que teria dissimulado o recebimento de “vantagens ilícitas” da OAS, que seria “beneficiária direita de esquema de desvio de recursos no âmbito da PETROBRAS investigado pela Operação Lava Jato”.
2.3.1 Para a configuração do crime previsto no art. 1º, da Lei nº 9.613/98, Lula e sua esposa teriam que ocultar ou dissimular bens, direitos ou valores “sabendo serem oriundos, direta ou indiretamente, de crime”.
2.3.2 Além de o ex-Presidente não ser proprietário do imóvel no Guarujá (SP) onde teriam ocorrido as “melhorias” pagas pela OAS, não foi apresentado um único elemento concreto que possa indicar que os recursos utilizados pela empresa tivessem origem em desvios da Petrobras e, muito menos, que Lula e sua esposa tivessem conhecimento dessa suposta origem ilícita.
Cristiano Zanin Martins e Roberto Teixeira
Da Redação
Com Brasil 247