Imagine que, no início do ano, alguém dissesse que o time no comando da economia brasileira seria, já no primeiro semestre, formado por: Henrique Meirelles no ministério da Fazenda, Ilan Goldfajn no Banco Central, Mansueto Almeida na Secretaria de Acompanhamento Econômico, Marcelo Caetano na Secretaria da Previdência, Carlos Hamilton na Secretaria de Política Econômica, além de Maria Silvia de Bastos Marques no BDNES e Pedro Parente na Petrobras. Certamente seria chamado de desvairado.
Era possível imaginar a queda de Dilma. Mesmo assim, ninguém poderia supôr que, DIlma fora, o interino Michel Temer conseguisse convocar talvez a melhor equipe econômica disponível no Brasil. A situação da nossa economia é dramática e, se esse time não conseguir virar o jogo, ninguém consegue. A dúvida agora é uma só: estaremos diante da Seleção de 1970, que nos trouxe o tricampeonato, ou da Seleção de 1982, que levou aqueles três gols saídos dos pés de Paolo Rossi?
Ambas tinham craques, ambas eram consideradas as melhores de seu tempo, ambas jogaram muita bola. Mas uma ganhou, a outra perdeu. O que determina a vitória ou derrota de um time não é apenas sua qualidade técnica, seu preparo ou treinamento. São também a equipe adversária e as condições de jogo. Eis os dois pontos que devem ser analisados para tentar imaginar o que poderá acontecer.
A equipe adversária são todas as forças que conspiram para deterioriar o principal problema diante da equipe econômica: o descalabro nas contas públicas. O déficit projetado para este ano já está oficialmente em R$ 150 bilhões, mas há esqueletos que poderiam elevá-lo talvez para mais que o dobro. Ninguém sabe direito o número certo, e a primeira medida do governo é estimá-lo para aprovar no Congresso uma meta fiscal factível – em vez da risível (R$ 24 bilhões positivos) deixada por Dilma.
O presidente interino encomendou um pente-fino nas despesas de todos os ministério. O Itamaraty, primeiro a fazer a lição de casa, já apresentou uma conta de R$ 900 milhões. A situação pré-falimentar de alguns Estados levou todos a pedir ontem em uníssono uma moratória de um ano no pagamento das dívidas. Tudo isso contribui para piorar as contas. E, até aqui, estamos apenas nas resistências já estabelecidas e contratadas, sem que o governo tenha tomado nenhuma medida.
Há também as resistências daqueles que, dependentes da máquina pública, lutarão a todo custo pela manutenção dos privilégios que terão de ser combatidos. O ministro Meirelles anunciou ontem que a Reforma da Previdência será prioridade. Qualquer reforma na previdência não tem efeito imediato no caixa e, para exercer um efeito maior, precisa envolver trabalhadores na ativa. Por isso mesmo, a proposta já levantou protestos de centrais sindicais e de lideranças que apoiam o próprio governo Temer, como o deputado Paulinho da Força.
Mesmo com larga maioria no Congresso, não será nada fácil para o governo aprovar essa e outras reformas de que o Brasil precisa com urgência para colocar a dívida pública em trajetória de queda. As condições do terreno são inicialmente favoráveis, pois Temer conta com ampla maioria na Câmara e no Senado, os campos onde se darão as batalhas decisivas. Mas esse é um jogo cujas regras contribuem para a paralisia em campo.
Elas são o “toma-lá-dá-cá”, os acordos de bastidores e o exercício do poder de troca que resta ao governo federal em ano de eleições municipais. Deputados e senadores querem dinheiro para vencer em seus Estados e, depois da Operação Lava Jato, nenhuma empresa doa mais nada para campanha nenhuma. Para conseguir o que querem, eles não hesitarão em dar canelada, fazer corpo mole ou até mesmo jogo desleal. Sabemos que, na Câmara, há gente que não hesita em pôr a mão na bola se preciso.
O primeiro teste para o governo será a aprovação de algum novo tributo, que Meirelles considera urgente para o déficit público não explodir. A sociedade brasileira, em especial o empresariado, não suporta mais impostos, ainda mais numa situação de recessão, em que niguém consegue investir. A mera pronúncia da sigla CPMF já basta para gerar urticária em qualquer um que produza algo neste país. Ainda assim governo quer – ou precisa – marcar esse tento logo.
Se conseguir abrir o placar, haverá uma sensação de alívio para o time da economia. Mas isso pode recrudescer a posição dos adversários em relação aos demais itens da pauta, sobretudo a reforma previdenciária. Se não conseguir aprová-la no segundo semestre, o jogo estará novamente embolado. E, em política, jogo embolado significa vitória do adversário.
Temer precisará usar todo seu talento político e sua capacidade de articulação – ao contrário de Dilma, ambos não lhe faltam – para que os planos do time da economia se transformem em jogadas que coloquem a bola dentro da rede. Ele tem na mão um time como ninguém nunca teve, conta com a boa vontade do mercado e a sensação de que chegou o momento de, enfim, dar ao Estado brasileiro um tamanho suportável. Telê Santana também tinha um grande time. Sócrates, Zico e Falcão eram os reis do “futebol arte”. Faziam golaços que lembravam os tempos de Pelé. Só que não trouxeram o caneco.
Da Radação
G1