Elaine Soares Bastos, de 39 anos, viúva de Paulinho, do Roupa Nova, que morreu aos 68 anos, em dezembro de 2020, após complicações da Covid-19, afirmou em conversa com Quem que fará fertilização in vitro para gerar um filho do artista. Elaine esclareceu que eles coletaram e congelaram os espermatozóides de Paulinho e seus óvulos em uma clínica no Rio entre 2012 e 2013, quando tentavam ter filhos, mas ela acabou desistindo do processo na ocasião. O material permanece guardado e, segundo Elaine, existe um documento assinado por Paulinho dando autorização a ela para retirar os espermas.
“Vou fazer o procedimento e terei condições de ter meus filhos. Nós fizemos [ela e Paulinho] essa coleta em 2012/2013. Não conseguíamos engravidar na época e, depois, ele começou a ter uma rotina de shows intensa. Já até mandei a declaração que o Paulinho me deu para o Dr. Luiz Fernando Dale [ginecologista especializado em reprodução humana]”, conta ela, que trava uma disputa judicial com os filhos do cantor, Twigg de Souza Santos e Pedro Paulo Castor dos Santos, para ter reconhecida a união estável com Paulinho e ser incluída na divisão da herança.
Muito abalada, Elaine contou como era a vida com o cantor e afirmou estar em depressão. “Estou com uma aparência péssima porque estou há um ano de cama. Só levanto para ir ao médico. Vivo de pijama, choro o dia inteiro. Às vezes fico mais de uma semana sem tomar um banho por causa da depressão. É muito dolorido falar sobre a morte do Paulinho. Fui a última pessoa a falar com ele. Na hora em que a enfermeira chegou para intubá-lo junto com a médica, no dia 1º de novembro [ele ficou internado de 12 de outubro a 14 de dezembro no Hospital Copa D’Or], lembro direitinho, eram 10h40 da manhã”, recorda.
Elaine chorou ao relembrar a última conversa que teve com o cantor. “Ele falou com a Dra. Aline Vargas [cardiologista]: ‘eu não posso ser intubado sem falar com a minha namoradinha primeiro’. Depois a Aline me falou que ele estava com os olhos lacrimejando. E aí atendi o telefone: ‘oi, Doutora!’ E ele falou: ‘não, namorada, sou eu!’ Falei:’ oi, namoradinho! Por que você está ligando do telefone da Dra. Aline?’ Fiquei preocupada, né? Ele falou assim: ‘calma, não chora’. Ele não gostava de me ver chorando. Não podia chorar que ele falava: ‘namorada, o que está acontecendo? Por que você está chorando?’ Aí ele falou: ‘vou falar uma coisa para você, mas me promete que não vai chorar?’ Falei: ‘prometo’. Ele falou assim: ‘eles vão me intubar agora’. Aí o telefone caiu da minha mão, quebrou a parte de trás. ‘Eles vão me intubar, vou fazer uma traqueostomia. E eu disse que não poderia fazer isso antes de falar com você. Você me promete que não vai chorar? Esses dias que estava aqui, peguei várias receitas da Ana Maria [Braga], gravei no telefone, assim que voltar para a nossa casinha, vou querer que Lizete [funcionária do casal], faça tudo para a gente. Mas não chora, não, que já, já eu estou voltando para a casinha. Promete que vai me esperar?”, recordou.
FASES
“Confesso que está sendo bem difícil falar sobre a morte do Paulinho [voz de choro], é um luto que considero interminável. Já tive momentos piores, a fase de não aceitação, a de raiva de Deus, a dos questionamentos: ‘por que com ele?, a gente vivia uma história linda de amor, por que foi interrompida assim, abruptamente, pela Covid, o linfoma?”
DIA A DIA
“Sou a esposa, a companheira, a amiga, a namorada, a administradora do lar, do dinheiro, da vida do Paulinho. Ele não toma um comprimido sem me perguntar: ‘namorada, posso tomar esse comprimido? Falaram que era bom. O que você acha?’ Trabalhei durante 15 anos na indústria farmacêutica, então tenho um certo conhecimento. Fiz faculdade de psicologia e direito, tenho duas formações. O Paulinho sempre confiou muito em mim. Confiança é uma coisa que se conquista, não se impõe. Falei no presente [sobre Paulinho] porque só consigo lembrar dele no presente, não consigo falar: ‘ele me perguntava’. Eu até falo, mas não gosto. Prefiro não falar nada a falar no passado”.
GRANDE AMOR
“Paulinho, antes de mais nada, era um ser humano. Mas era uma voz insubstituível. Sempre brincava com ele dizendo que eu era fã número zero dele. Nós nos conhecemos quando eu era bem novinha, na casa do meu primo, na Lagoa [bairro da Zona Sul do Rio], em uma Copa do Mundo. Não o conheci em show, nunca pertenci a fã-clube. Na época, ele profetizou que me esperaria crescer para casar comigo. Achei aquilo engraçado e acabou acontecendo anos depois. Tudo o que ele fazia era comigo concordando e eu a mesma coisa. Foi um hábito que criamos para respeitarmos um ao outro”.
EXEMPLO
“O Paulinho era uma pessoa maravilhosa. Antes de ser artista, era um homem, um maridão, daqueles que todo mundo gostaria de ter. As pessoas sempre me invejaram por eu ter um marido igual a ele, falavam: ‘nossa, como o Paulinho é gente boa, como é um cara humilde’. Discutir é normal. Amigos discutem, namorados, casais. Mas nada que faltasse o respeito. Falar do Paulinho para mim é falar do homem que eu amo, de um artista insubstituível, de uma voz inigualável, um cara que lutou, que foi um vencedor. Ele batalhou pela vida enquanto pôde, não queria ir embora, partir agora”.
EXAMES
“Sempre marquei os exames de rotina do Paulinho para janeiro porque era uma época que o Roupa Nova tinha menos show por ser férias. E em fevereiro eles tiram férias. Sempre foi assim. Entre novembro e dezembro, eu ia com ele ao Cláudio Domênico [cardiologista], que tem uma equipe maravilhosa, a Dra. Aline e o Dr. Felipe. Foi essa equipe, aliás, que cuidou do Paulinho durante a internação dele. Com a ajuda do Roupa Nova, dos sócios do Paulinho, falei que ele não podia ficar à deriva no hospital, esperando um médico ligar uma vez por dia para dar notícia de um paciente. Afinal de contas, ele tinha mais de 50 anos de carreira. Ele merecia o que ele teve. Merecia muito mais. Então ele tinha um médico que ia ao hospital duas vezes por dia e passava os relatórios para mim, para o meu telefone, e eu encaminhava para o empresário do Paulinho, que montou um grupo e encaminhava para os sócios para que todos tivessem notícia”.
LINFOMA
“Em 2017, quando marquei os exames de rotina dele e ele foi fazer em janeiro de 2018 foi descoberto um linfoma quando durante uma ultra de abdômen total. Esse linfoma era um nódulo que estava entre o intestino e o fígado, estava solto ali. O Paulinho teve um ‘linfoma não-Hodgkin na zona marginal indolente’. Aí o Dr. Cláudio Domênico o encaminhou para o Dr. Carlos, oncologista, em Botafogo. Ele começou a fazer todo o tratamento. Começou com seis sessões de quimioterapia com intervalo de 21 dias. Depois, fez um Pet-Scan e continuou fazendo a manutenção. Ele estava bem. Tomava um remédio, uma injeção na barriga, que era a manutenção da droga que ele usava na quimioterapia”.
LADO A LADO
“Quem sempre esteve com ele fui eu. Mais ninguém. Fui amada por aquele homem até o último suspiro dele. Começaram as sessões de químio e ele não perdeu um show. O fato de ele ter tido o linfoma não o impossibilitou de fazer os shows. Ele voltava para casa cansado, mas nunca foi substituído enquanto fazia quimioterapia, nunca. Ele sempre quis ser valente. Depois o linfoma voltou e ele teve que fazer um outro protocolo de quimioterapia de 2019 para 2020. Esse sim ele ficou curado. Só que ele tinha uma insegurança porque um dos efeitos colaterais da quimioterapia era a mucosite, uma secreção que dá entre a traqueia e a garganta. Apesar de ele cantar pelo diafragma, ele ficava inseguro de na hora de dar uma nota muito alta, a secreção vir. Isso incomodava muito ele. Ele deu o máximo possível. E foi até onde aguentou”.
TRANSPLANTE
“No período da pandemia, nós fomos ao médico e ele falou: ‘Paulinho, você está pronto para fazer o transplante de medula óssea autólogo [procedimento em que as próprias células-tronco do paciente são usadas]. Um transplante dele para ele mesmo. Assisti todo o procedimento. Só podia ter um acompanhante e ele me escolheu. Fiquei alguns dias com ele no CHN em Niterói. Deitava na cama para ver filme com ele, ia com ele ao banheiro, tomava banho com ele, esfregava as costas e tal. Sempre cuidei dele como um bebezinho. A gente se amava muito e isso despertou muita inveja em muita gente. Ele falava que me amava mais do que a própria vida dele. Ele fez o transplante e no dia 5 de outubro, viemos para casa. Inclusive ele veio dirigindo o carro dele. Moramos na Tijuca, e ele dirigiu de Niterói para a Tijuca”.
PÓS-TRANSPLANTE
“Quando chegamos, ele estacionou o carro dele na garagem e falou que não aguentava mais comida de hospital. Disse: ‘vou aqui embaixo, na churrascaria, comer uma costelinha com uma coca e não vou demorar. Já estou subindo’. Como é que eu ia dizer para ele não ir? Ele botou a máscara, desceu e estava bem, mesmo transplantado. Aí ele chegou, tomou um sal de fruta porque falou que tinha comido muita costela. Deitou na sala com uma almofada e começou a ver filme. No domingo, dia 11 de outubro, ele acordou febril. Eu tinha comprado um oxímetro e a oxigenação dele estava 79. Aí liguei para o Cláudio Domênico e ele falou: ‘Elaine, leva ele para o Copa D’Or ou para o Copa Star agora’. Levei para o Copa D’Or”.
COVID-19
“Chegando no Copa D’Or, ele fez um exame de Covid e já ficou internado com aquele oxigênio no nariz. Ele não estava sentindo nada e ficou esperando o teste do PCR. Foi aí que deu positivo. Eu também tive, só que eu já estava em casa. A gente não sabe de quem pegou. Só sei que nós dois voltamos do CHN, em Niterói, com Covid. Quando falei que também estava infectada, ele ficou muito desesperado e preocupado, achando que eu tivesse que me internar. Perguntou como ia ser eu e ele internados. Mas, graças a Deus, perdi olfato e paladar, mas fiquei em casa. Ele falava comigo por chamadas de vídeo”.
INTUBADO
“Fiquei sem ver o Paulinho de 1º de novembro, dia em que ele foi intubado, até o final de novembro. Porque depois que ele repetiu o segundo teste de Covid e deu negativo, ele foi para a UTI Neurovascular. E aí lá eu ficava todo dia. Cortava a unha dele, fazia orações no ouvido dele. Teve um dia que comecei a orar e beijar o rosto dele, não sei se tinha alguma coisa no olho, alguma lágrima. Ele fez um movimento com o ombro como se quisesse se levantar. A enfermeira falou que ele estava emocionado ao ouvir minha voz e queria reagir de alguma forma, mas a medicação não deixou. Saí de lá arrasada e fui embora para casa. O horário de visitas era de duas às três da tarde, só que eu chegava uma da tarde para sair de lá cinco, seis da noite. Eu sou muito comunicativa e fiz amizade com toda a enfermagem. E eles falavam que nunca viram uma esposa se ajoelhar na cama do marido e ficar orando como eu orava pedindo a Deus para ele voltar para casa. Mas foi a vontade de Deus”.
DESPEDIDA
“Quando saí de lá nesse mesmo dia foi uma despedida dele. Cheguei em casa sete e meia da noite, na Tijuca, e às 20h45, o Cláudio Domênico me ligou e falou: ‘o Paulinho veio a óbito’. Fiquei enlouquecida. Tinha acabado de chegar de lá, fiquei sentada na cama, sem conseguir acreditar. Fui separar a roupa dele e peguei a roupa mais cara que ele tinha. A melhor calça, a melhor camisa, um colete preto de cetim lindo que ele usava para fazer show. Ele era muito vaidoso. Passei perfume Polo nele, aquele verde. Botei ele todo bonito e fiquei sentadinha do lado dele até a hora da cremação. Vivi esse luto o ano inteiro e por causa da medicação [para a depressão] engordei muito. Eu tinha medo de tomar banho, de pegar o elevador, de dirigir, fiquei com síndrome do pânico, misturado com depressão e TAG (Transtorno de ansiedade generalizada)”.
NÃO ACEITAÇÃO
“Eu não estava preparada para a partida do Paulinho. Fiquei muito tempo em casa tomando a medicação que agora está diminuindo e dei um tempo com o Dr. Luiz Fernando Dale, da FIV. Vou fazer a FIV, mas, para fazer, não posso tomar alguns medicamentos que ainda estou tomando. Tenho que ir tirando aos poucos a medicação. Agora já consigo dormir, mas ainda choro todos os dias. Comecei a tomar injeções de hormônio [para a FIV], mas o psiquiatra teve que suspender. Então tão logo eu possa retornar ao Dr. Luiz Fernando, vou fazer a FIV porque lá tem meus óvulos e os espermatozóides dele. Ele deixou uma autorização explícita botando o meu nome, que só eu poderia retirar esses espermatozóides que foram colhidos para darmos continuidade à nossa família, uma nova família. E vou eternizar meu marido. Ele já está eternizado no meu coração, mas pelo menos uns pedacinhos dele vou ter”.
MÚLTIPLOS
“Não sei se serão dois [bebês] porque o Paulinho é gêmeo, se serão três bebês. Mas a ideia da minha gravidez não acabou. Só dei uma parada devido à medicação. Estou morando no nosso apartamento na Tijuca, moro aqui sozinha enquanto está transcorrendo o processo [ela trava batalha na Justiça por herança com os filhos do cantor] porque tenho o direito real de moradia por ser esposa dele. Estou aqui no nosso apartamento, no nosso cantinho. Eu não consegui mexer em nada dele: roupa, tênis, sapato, escova de dente, nada. Nem no escritório nem nos quadros que ficam no corredor. Para mim é como se ele fosse chegar a qualquer momento. Em casa, qualquer lugar que ando tem a marca dele. Em 2020 dei uma TV para ele que está na sala, ele queria muito, e não consigo ficar lá porque sei o quanto ele amava essa televisão. Minha família me ajuda, mas recebo a pensão dele no INSS, porque ele se aposentou com o teto por morte. E o apartamento é próprio. Minha mãe me ajuda muito. Estou seguindo a minha vida, esperando terminar o processo para saber o que vai acontecer”.
CRÍTICAS
“Eu lido muito bem com as críticas. Porque sejam elas construtivas ou destrutivas, é o direito de cada um tem. Tem as pessoas julgadoras, que não têm o conhecimento de causa sobre o assunto e vão seguindo o que os outros falam. Vejo como pessoas despersonalizadas. Até mesmo porque, para você fazer uma crítica ou julgar qualquer que seja a situação, você tem que ouvir os dois lados. A minha pergunta, que não quer falar, é a seguinte: ‘por que tudo isso veio à tona só depois do falecimento do Paulinho?’ Eu e ele éramos reclusos em casa. Eram pouquíssimas as festas que íamos porque a gente gostava de respeitar a nossa privacidade. Para mim o que importa é a minha consciência, é deitar no meu travesseiro com a sensação de dever cumprido, sabendo que eu era a única mulher que ele amou de verdade em toda a vida dele. Fui a mulher que ele quis ter filhos, a que ele escolheu para ser a companheira dele até o último suspiro, que foi o que aconteceu. Crítica a gente sempre vai ter. Lido muito bem com elas porque o que importa é o que sinto. Se as pessoas fizessem críticas e elas fossem verdadeiras talvez isso até me machucasse um pouco, mas é aquele ditado: ‘quem tem boca fala o que quer’. Agora tem que provar as coisas que se fala”.
Da redação/ Com Revista Quem