Procura chinesa movimenta caça de onça-pintada e outros felinos nas Américas

Publicado em segunda-feira, junho 15, 2020 · Comentar 


Quando se trata de questões relativas à conservação de fauna silvestre, só se tem notícia ruim ultimamente. O jornal The New York Times de quinta-feira (11) publicou uma matéria sobre o aumento exponencial do tráfico de felinos sul-americanos, em especial de onças pintadas (Pantera onca), para os mercados chineses. Não apenas para consumo como suposto uso medicinal (o que em si já constitui um crime), mas para o uso de seus dentes caninos como colares, brincos e outros badulaques tidos como símbolo de status.

Especialistas em crimes ambientais de diversos países da América Latina já vinham suspeitando que o comercio de felinos vinha se intensificando, à medida que carcaças e peles apareciam com maior frequência em mercados domésticos, sem que as autoridades tomassem quaisquer providencias. Somente agora, biólogos da Universidade Oxford Brooks, na Inglaterra, entrevistados na reportagem do NYT, publicaram um estudo detalhado em 02 de junho de 2020 no jornal cientifico Conservation Biology, no qual demonstram o brutal aumento do comercio ilegal de felinos. O estudo analisou milhares de casos de apreensões em 19 países das Américas do Sul e Central e China, e criou um modelo associando esses casos com condições políticas e socioeconômicas de cada pais.

O resultado indica que os felinos sul americanos como onças pintadas, pardas (Puma concolor) e jaguatiricas (Leopardus pardalis) entraram no mercado chinês como substitutos do tigre asiático para satisfazer a demanda por medicina dita “tradicional”. Mais recentemente, porém, o estudo identificou que as apreensões de felinos aumentaram com o tempo e a maioria das peças apreendidas de onça-pintada eram caninos (1991, 2117) para bijuteria. Cerca de 34% (32 de 93) dos relatórios de apreensão de onças-pintadas estavam vinculados à China.

Segundo os especialistas, os países de origem dos animais com níveis relativamente altos de corrupção, investimento privado chinês e baixa renda per capita tiveram de 10 a 50 vezes mais apreensões de carcaça de onça-pintada do que os demais países da amostra. O estudo aponta o Brasil como o maior abastecedor do tráfico de onças-pintadas para a China, com o maior número de casos, seguido da Bolívia, Suriname e Colômbia.  No caso, seriam a pobreza e os altos níveis de corrupção nesses países de origem que motivam a população local a se envolver em atividades ilegais e contribuir para o crescimento desse comércio.

Um dado preocupante apresentado é que as políticas perfeitamente legais de comercio entre os países das Américas e a China poderiam estar propiciando e abrindo caminho para o comercio ilegal dos felinos, seguindo um padrão idêntico ao tráfico de animais na África, onde já foi identificado um paralelo entre a crescente presença de grupos empresariais chineses investindo em grandes projetos de desenvolvimento e o aumento do tráfico de leões (Panthera leo) e leopardos (Panthera pardus).

Enquanto a situação socioeconômica e política dos países não se resolvem, nos resta a solução de suprimir a demanda, sobretudo na China. Como fazer os chineses entenderem que algumas tradições antiguíssima já não têm espaço no mundo moderno? Que pequenas pílulas azuis dispensam o uso de chifres de rinocerontes e bexigas de tigres? Que tradicionais mercados molhados são uma ameaça à saúde – e uma vergonha?

Se tradições não pudessem ser rompidas, até hoje nossas lavouras dependeriam de trabalho escravo. Ao invés de fomentar as cruéis touradas – uma forte tradição da Península Ibérica – jovens espanhóis criaram o lema “Tortura não é Esporte nem Cultura”, abolindo o sangue nas arenas. Abolir praticas negativas pode e deve ser feito. Afinal, está claro que algumas tradições servem apenas de pretexto para encobrir ganância e vaidade. E delas precisamos proteger nossa biodiversidade, enquanto é tempo.

Da redação/ Com O Eco

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