A última conspiração

Publicado em segunda-feira, agosto 20, 2018 · Comentar 


Manuel Galdêncio

Para quem não sabe – MAG é uma sigla  formada pelas iniciais do nome do ex-deputado Manoel Alceu Gaudêncio de tradicional família caririzeira que já deu até senador. Onde hoje está edificado o MAG Shopping, existia uma ampla residência que somada ao espaço do Hotel Manaíra, deu lugar  ao novo empreendimento. A Casa de Manezin, como era conhecida, foi sem dúvida o cenário principal da última conspiração política que a Paraíba testemunhou.

Decorria o ano de 1978 e os militares escolheram Tarcísio Burity para o cargo de Governador da Paraíba contrariando amplo movimento popular que desejava a ascensão de Antônio Mariz ao Palácio da Redenção, através da eleição indireta. A dissidência da Arena, da qual eu fazia parte juntamente com Manoel Gaudêncio, Edvaldo Motta, Chico Soares, José Lacerda, Tarcísio Telino e Américo Maia, para só falar nos deputados estaduais,  resolveu apoiar Mariz  no enfrentamento ao regime, disputando no voto a indicação da Convenção da Arena. Para que houvesse a concorrência foi preciso que contássemos com o apoio decisivo de Waldir dos Santos Lima, Presidente da Arena  e partícipe dos entendimentos que culminaram com a escolha de Burity. Todavia, considerando-se traído pelo grupo palaciano, Waldir resolveu engrossar as nossas fileiras e aceitou ser candidato a vice na chapa de Mariz.

Outro inesperado rebelde foi Ernani Satyro. Homem de confiança da chamada revolução de março, ex-lider de Costa e Silva e ex-Ministro do Tribunal Militar, completoua chapa disputando a vaga de Senador biônico, epíteto pejorativo com que premiaram os senadores sem voto popular.

Nessa conspiração contra a decisão do regime militar, João Agripino, inicialmente, desempenhou papel muito aquém do nosso desejo. Ao chegar à Paraíba, ao invés de aderir ao processo tentou a conciliação e lutou com todas as suas forças para demover Mariz do que ele chamava de suicídio político. Na ocasião, três candidatos avulsos, digamos assim, resolveram enfrentar o Planalto. Um em Minas, outro em São Paulo (Maluf, vitorioso) e Mariz, na Paraíba. Agripino dizia que todos seriam cassados após a realização das convenções arenistas. Queria salvar Mariz. Amigo do General Golbery do Couto e Silva, suas palavras impressionaram a todos nós que não desejávamos abrir mão da permanência de Mariz na política da Paraíba. Faltava conseguir intimidar Mariz, uma tarefa impossível.

Aloísio Afonso Campos ditou, eu escrevi e João Agripino alterou o texto da renúncia de Mariz à disputa indireta. Para se chegar a essa solução negociamos que o próprio Agripino fosse nosso candidato ao Senado, na disputa direta.  Guardei o original desse documento, depoispublicado por Jório Machado em “Resistência ao Medo”. Decisão tomada, fomos todos para nossas casas. Acordei no começo da noite com um telefonema de Mariz que indagava:

– Você divulgou a renúncia ? Respondi que não, apenas  datilografara o documento.

– Não mostre a ninguém e vamos nos reunir às oito horas na Casa de Manezim, recomendou-me.

Cheguei no horário. Muitos dos  inconfidentes já se encontravam acomodados e curiosos para saber a razão da convocação. Aguardava-se a chegada de Mariz, que nos disse:

– Fiz alguns contatos e tomei uma decisão. Não poderia jamais pedir votos aos paraibanos, se recuasse da disputa, com medo da cassação. Prefiro ser cassado a recuar por medo. Sou candidato e vou à convenção. Conto com vocês? (Contou !  Inclusive com Agripino.)

Nem precisamos responder. Gritaria geral. Aplausos e abraços. Eu e Telino, a quatro mãos, nos encarregamos de rasgar a Carta Renúncia. A versão datilografada, bem entendido.

Desta vez não precisamos esperar ansiosamente pela chegada de Ernani para que Manezim abrisse o seu melhor whisky.

Fomos à convenção, perdemos por pouco, mas escrevemos um bom capítulo da história recente  da Paraíba. ( Republico esse texto em homenagem ao ex-deputado Manoel Gaudêncio que acaba de comemorar seus oitenta anos de nascimento. Como se depreende, Manoel, além de testemunha é também e, com méritos, um personagem da história política da Paraíba).

Ramalho Leite
Jornalista/Ex-Deputado – Colunista

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