“A mulher que perde um filho é uma sombra”, diz mãe de bebê que morreu aos 11 dias de vida

Publicado em quinta-feira, junho 9, 2016 · Comentar 


Camila com o filho mais velho, Pedro Luís, o marido Luis Fernando, e Joana, que nasceu após a morte do irmão José João Mauro  Carillo / Divulgação

Camila com o filho mais velho, Pedro Luís, o marido Luis Fernando, e Joana, que nasceu após a morte do irmão José João Mauro
Carillo / Divulgação

Após uma gestação normal, o pequeno José nasceu no dia 4 de março de 2011. Onze dias depois, morreu, deixando para trás uma família devastada e confusa diante daquilo que chama de contrassenso — como lidar com a morte em um momento em que tudo que se espera é celebrar a vida?

José era o segundo filho do casal paulistano Luis Fernando e Camila Goytacaz. Para homenageá-lo, sua mãe, jornalista, escreveu um livro, Até Breve, José, em que narra a trajetória da gravidez ao luto e sobre como encontrou forças para enfrentar a maior dor que pais podem enfrentar: a perda de um filho.

“A mulher que perde um filho assim está em um limbo. Ela é uma sombra. Ela não tem barriga, mas também não tem bebê. Ela tem leite, mas ninguém mama. Ela não é mais aquela, mas também não é mais uma outra”, diz Camila, que, naquela época, já era mãe de Pedro Luís, hoje com sete anos.

Ela, que deu uma palestra durante o 3º Simpósio Internacional De Assistência ao Parto, em São Paulo, conta que, depois do lançamento do livro, passou a receber mensagens de outras famílias enlutadas relatando suas histórias e buscando algum tipo de apoio nas palavras de alguém que já esteve no mesmo lugar.

“Eu achava minha história muito forte, e agora acho ela tão pequena diante destas outras. Ouvi casos de mulheres que não puderam mais ter filhos, por exemplo”. A todas as mães que lhe escrevem, Camila conta que pergunta o nome dos bebês, mas jamais questiona qual foi o motivo da morte deles — assim como, em seu livro, os leitores também não encontrarão o que levou José a óbito.

Camila acredita que falar sobre a morte é necessário, inclusive sobre a morte de filhos pequenos. “Para morrer, só basta estar vivo. Não podemos jogar esta questão para baixo do tapete. Que tapete é esse, gigante, para caber algo deste tamanho? Não ponha a morte de um filho embaixo do tapete. Ponha na parede, fale sobre isso, viva isso”, recomenda.

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Já àqueles que convivem com uma mulher que perde um bebê, a jornalista sugere que, acima de tudo, se façam presentes. Para ela, sempre há algo que se possa fazer para ajudar aquela mulher, compreendendo o que é o luto e qual é a dor que ela sente. Mas, sobretudo, Camila aconselha que se respeite o processo.

“Assim como no parto, no luto cada mulher também tem seu tempo. É normal acordar um dia feliz, no outro acordar triste. Não tem jeito certo de viver um luto. O julgamento dos outros vai vir de qualquer jeito, então saiba que você pode e deve fazer tudo que quiser”, avalia ela, relembrando também quando se viu feliz em um determinado dia depois da morte de José.

“O dia em que eu dei risada eu me senti muito culpada. Como eu podia ir ao cinema depois que meu filho morreu? Como eu podia rir? Meu recurso para lidar com tudo era escrever. E cada um vai achar o seu recurso, e todos são aceitáveis, desde que não sejam autodestrutivos”.

A jornalista conta que diversas vezes se pegou imaginando como as coisas teriam sido caso tivesse feito algo de maneira diferente. Para ela, todas as mães se sentem culpadas naturalmente, e, no caso das mães enlutadas, este sentimento vem com muito mais força, fazendo com que a mulher chegue a cogitar que a morte do bebê tenha sido por sua responsabilidade.

“O bebê já morreu mesmo, seu filho já se foi, então para quê ficar procurando de quem é a culpa? O ‘e se’ é o nosso maior companheiro no luto. Beira o nível de loucura a forma com que entramos nisso, pensando como poderíamos ter evitado a morte. Só que isso não leva a lugar nenhum. É uma página para trás, enquanto que, no luto, só há capítulos para frente”.

Depois da morte de José, Camila engravidou novamente, desta vez de uma menina, Joana, que nasceu em março de 2012 e veio para fazer companhia ao irmão mais velho, Pedro Luís.

Ela conta que, assim como acontece com a maioria das mulheres em gestações seguintes à perda de um filho, ela sentiu muito medo enquanto esperava a chegada da menina.

“A mulher no luto é um vaso de cristal todo quebrado, remendado. Ela vai viver com esses medos para o resto da vida. Na nova gravidez também, o outro bebê vai fazer ela se lembrar do bebê que se foi”, explica Camila, enquanto se lembra de um episódio recente, quando olhou pelo retrovisor do carro e avistou duas cadeirinhas de criança no banco traseiro e imaginou que, caso José fosse vivo, ele estaria ocupando um lugar ali no meio.

“Não é simples lidar com isso. Exige uma força visceral, que a gente tira das entranhas. Minha proposta nesse livro foi trazer esperança, especialmente porque me sinto muito curada, muito preenchida. Se eu pudesse nascer de novo, eu talvez fosse escolher passar por isso outra vez. Parece uma insanidade dizer isso, mas me fez tão mais consciente do valor que se tem ter uma outra criança ali saudável, feliz. Que bom que o José me ensinou isso”.

Da Redação
Com R7

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